O Triunfo


   O filme impulsiona-nos a revisitarmos as nossas concepções de práticas educativas, com ênfase aos professores que tivemos, aos professores que somos e aos que queremos e/ou idealizamos ser. Também é pertinente ressaltarmos que nem todas as cenas do filme evidenciam uma realidade compatível com uma vivência que se correlacione com as possibilidades em sala de aula. No entanto, essa produção cinematográfica potencializa o nosso olhar educacional, provocando uma série de sentimentos positivos que só vêm à tona quando se sabe o que nos leva a querer ser e continuar sendo professor.
   O senhor Clark saiu de uma escola provinciana porque supunha que ali não havia mais desafios a vencer, ou seja, que a docência, por melhor que fosse, não lhe ofertava um retorno de "ó, estou fazendo a diferença". Sendo movido pela máxima de mudar positivamente o meio circundante, ele ruma para um local onde é detectável a marginalização da sociedade. O emprego que consegue em uma das escolas aumenta o seu anseio de fazer a diferença. Em contrapartida, a escola não se preocupa em promover e/ou aceitar mudanças. Eis, assim, a imposição de uma barreira quase intransponível.
   Já em sala de aula, ao instaurar regras de boa convivência, calcando-se na ideia de que a turma compõe uma família, também se consagra em uma proposta falha. É assim, em meio às ideias que não vingam, que o educador vai tentando encontrar o tom certo para a sua intervenção.
   Antes de ingressar em sala, o professor, orientado por uma boa vontade sem precedentes, empreende uma jornada para conhecer as famílias dos seus futuros alunos. A tentativa do conhecer, infelizmente, não é bem aceita e por isso não gera os resultados esperados.
   O que o filme apresenta são alunos que além de não receberem estímulo da família, também não esperavam recebê-lo da escola. Dada a sedimentação dessa visão atenuante e negativa, a empolgação do professor recém-contratado ecoa na sala e retorna trazendo consigo dissabores de quem já não acredita nos poderes transformativos da educação; afinal, beira ao impossível a missão de mudar o que não quer ser mudado.
   Mesmo assim, não se dando por vencido, o professor visa a buscar diferentes metodologias para cativar aos alunos, ao passo que precisa desvincular-se da perseguição do diretor e da ausência de estímulos que a escola destinava às turmas que mais precisavam. Basicamente é esse o enredo de “O Triunfo”, sendo que uma análise crítica requer que pensemos nos seguintes aspectos:
   Em termos de análise via olhar da Psicologia da Educação, a compreensão do aluno é um dos destaques da história. O professor Clark é a personificação do docente comprometido com o meio educacional: ele busca, incansavelmente, atingir a totalidade de se conhecer as minúcias que cercam cada educando seu. Assim, como afirma Piletti (1998, p.20) “O aluno não é um ser ideal, abstrato. É uma pessoa concreta, com preocupações e problemas, defeitos e qualidades”. Todos os discentes receberam a devida atenção do mestre: após conhecer a problemática que acometia cada ser em formação que lhe fora conferido, o senhor Clark não mediu esforços para atenuar e/ou solucionar os empecilhos que influenciavam os alunos a terem comportamentos negativos em relação aos estudos. Transposto isso, foi nítido o desenvolvimento dos educandos, sendo que nas cenas finais do filme cada aluno recebeu um troféu pela qualidade/característica diferenciada que tinha.
   Não podemos deixar de mencionar que, ao instaurar nos educandos o anseio do aprender, a turma consagrou-se como a melhor, segundo o teste aplicado ao final do ano (similar a provinha Brasil). Esse resultado surpreendeu a todos, no entanto, foi apenas um mecanismo que tornou visível todo o empenho do docente. Na verdade, como o próprio professor comentou, não é um teste que deve mover a escola, mas sim as aprendizagens construídas. Esse tipo de avaliação ajuda a “medir” a internalização do conteúdo por parte dos discentes, porém a sua potencialidade para aí; não consegue medir a humanidade que a sala de aula emana ou o quanto um professor, pela sua postura, muda a direção de vidas.
   A compreensão do processo ensino-aprendizagem, outro aspecto fundamental elencado por Piletti (1998), foi um dos alicerces primordiais do roteiro de “O Triunfo”. O professor pensou e repensou muitas vezes como que esse processo se dava em sua turma: a busca pela maneira mais eficaz de despertar a atenção e a aprendizagem dos alunos foi densa e reuniu uma série de tentativas, algumas frustradas, outras bem sucedidas. Saber e dominar o conteúdo a ser lecionado não oferta ao docente a garantia de sucesso frente à sala de aula, o que promove esse sucesso é compreender qual é a linguagem e a postura que mais cativa os educandos na hora da assimilação do conteúdo. As aspirações e as necessidades dos aprendizes têm papel de vital importância no processo de ensino-aprendizagem e cabe ao educador perceber isso e visar a adequar o seu trabalho, da melhor forma possível, aos anseios do coletivo.
   Já a compreensão do papel do professor deve passar pela ideia de que nenhum docente é o detentor da verdade. Logo, há a recorrência ao princípio que move ou deveria mover todo educador “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (FREIRE, 1996, p. 23). Alunos e professores revezam-se no aprender e no ensinar e esse é um processo perfeitamente natural. Nesse âmbito ainda soma-se a ideia de que o professor não é apenas um mero transmissor de conhecimentos, mas um exemplo adulto para seres em formação, uma espécie de vitrine sempre em evidência, sendo que qualquer erro postural repercute negativamente em todo o processo educacional. Não é raro lembrarmo-nos com saudosismo do relacionamento que tivemos com determinados professores; talvez não lembremos com exatidão do conteúdo que foi ministrado por eles, mas a postura (positiva ou negativa) jamais será esquecida.
 Por fim, resta-me responder à reflexão proposta pelo questionamento: "será que você enquanto professor teria habilidade, desejo e força de vontade para fazer o que este professor fez? Se ele conseguiu, você também conseguiria?". Inicialmente, revelo a minha admiração para com a figura do professor veiculada pelo filme. Na prática, acredito que faço de tudo para melhorar a realidade em que estou inserida enquanto professora; não foram poucas às vezes em que levei para além do ambiente de trabalho determinados alunos em pensamento. Levar trabalho para casa e para as horas de folga é uma das características mais marcantes de um professor comprometido e apaixonado pela profissão que escolheu: assim, do nada, em pleno almoço de domingo, vem à tona uma ideia de como solucionar um problema ou como abordar um tema em sala de aula.
   Ficou evidente que o professor Ron Clark não tinha vida social e que todo o tempo era destinado a pensar na próxima intervenção para com os alunos. Isso é um ponto negativo. Apesar de sermos professores e de jamais a sociedade nos desvincular desse papel, a vida social é importantíssima para que nos sintamos completos.
   Acredito, também, que todo docente, seja eu ou meus colegas, pode promover mudanças positivas nas turmas em que leciona. Para tanto, o estabelecimento de vínculos com os discentes é fundamental para chegar-se ao cerne da questão e a partir daí construir as pontes tão necessárias para a consolidação de uma educação mais humana; afinal, muros qualquer professor constrói, pontes só os melhores e vocacionados, sendo que o triunfo é o resultado de todo esse processo.

BIBLIOGRAFIA

FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. 39. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

PILETTI, Nelson. Psicologia Educacional. 6 ed. São Paulo: Ática, 1998.

Texto escrito pela bolsista do Mão Amiga: Simone  Luiza Kovalczuk  
13

13 Comentários :

Anônimo disse...

Muito boa a sua análise bolsista Simone. Indico outro filme que também é muito bom: Escritores da Liberdade.

Simone Luiza disse...

Obrigada, Anônimo. Já assisti ao filme "Escritores da Liberdade" e gostei muito. Também o indico.

Anônimo disse...

Mais uma vez a bolsista Simone Kovalczuk nos brinda com um brilhante texto que nos incita a amar cada vez mais a profissão docente!!!Parabéns!!!
Prof.ª Rosana Beatriz Ansai
Coordeandora do Projeto Mão Amiga

Anônimo disse...

Sem dúvida esse filme nos faz refletir sobre nossa prática docente, e a paixão que todas nós pela nossa profissão.
E Parábens Simone pela sua análise critica maravilhosa.

Unknown disse...

Parabéns Simone por mais uma brilhante análise.....

Anônimo disse...

brilhante Simone...me sinto orgulhosa em compartilhar sua dedicação e profissionalismo. Sucesso e que Deus prospere sua vida em todos os aspectos...


Rozinei Cardozo Kranholdt

Simone Luiza disse...

Muito obrigada a todas!
Fiquei muito feliz com tantos elogios.
Vocês são muito gentis.

Unknown disse...

Um filme maravilhoso, nos faz reletir e muito. Vale a pena assistir!

E, também um ótimo texto da colega Simone!

Unknown disse...

otimo esse filme é maravilhoso

Unknown disse...

otimo esse filme é maravilhoso

Josiane disse...

Assisti ao filme e gostei muito. Ele motiva nós docentes, nos dá esperança de mudança significativa no contexto escolar. Como você aponta Simone em fazer de tudo para melhorar a realidade em que está inserida enquanto professora; e que não foram poucas às vezes passou pensando em como solucionar os problemas de seus alunos fora do ambiente escolar. São ações parecidas com as que tenho a cada vez que chego em casa frustrada por os alunos não prestarem a atenção enquanto eu falava, ou de não darem a mínima importância pelas temáticas e dinâmicas desenvolvidas por mim em sala. Mas nem assim deixo de procurar soluções de de me aproximar deles, pois acredito na educação. Não há como inserir na vida social de meus alunos como acontece no filme como o professor Clark faz, mas não desisto de buscar estratégias e estabelecer vínculos mais afetivos com cada aluno.

Josiane disse...

Parabéns pela resenha do filme. Ficou ótima, muito bem fundamentada e escrita.

Simone Luiza disse...

Obrigada, Josiane.
Apreciei muito o seu comentário, principalmente quando você pontua que acredita na educação. É apenas quando acreditamos no poder transformativo da educação que sujeitamo-nos a vencer os desafios diários impostos pela dinâmica escolar. Enfim, obrigada por comentar!

Postar um comentário